quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Tempo e velocidade

Agora à noite datei um documento e vi que era 20 de Janeiro. Lembrei que era aniversário de minha Carmem e eu nem sabia se ela chegara da Argentina.  Vi que  era quase meia noite mas eu devia ligar assim mesmo. E vi que o Dia de São Sebastião já havia chegado e acabado, num ano que como todos os últimos da minha vida vai passando em alta velocidade.  Nao deve ser só minha esta percepção de que a vida transcorre agora em alta velocidade, logo agora que eu preciso de mais tempo para fazer tanta coisa que ainda não foi feita. E vi que 2010 vai seguindo o mesmo embalo, e que tantas coisas já acontecerma, na minha vida e na vida do mundo, nestes 20 dias.  Há um governo novo, há uma mulher no comando do país, e tudo isso é novo e já foi tão desejado mas há uma tragédia que nos incomoda a todos, um sentimento de impotência e fraqueza diante do que aconteceu na região Serrana do Rio, onde morreu muito mais gente do que se escreve por aí, onde a coisa é mais feia do que se conta, e eu sei porque há quem me escreva de lá narrando as coisas espantosas que castigaram ricos e pobres naquelas serras tão bonitas, tão azuis. E lembro Petrópolis, meu encanto com a serra e a vegetação, quando lá fui escondida  e vivi clandestina algum tempo, que hoje nem sei precisar, numa daquelas horas de horror durante da ditadura. E houve Petrópolis, e depois Teresópolis e desde então amo aquelas terras, que são continuação de Minas, as serras e as terras.  Nao sei porque estou lembrando aqueles tempos agora. Deve ser porque hoje recebi o Hamilton Pereira, agora Secretário de Cultura de Brasilia, e num desvio de nossa agenda de trabalho ele acabou me contando coisas terríveis de seu tempo na Oban e no Carandiru, como preso politico,  sobre outros cabos-anselmos que andam por aí, e embora eu tenha trabalhando umas dez horas depois daquela conversa, ela me ficou na cabeça. Mas eu, que tão pouco posso vir ao blog, vim aqui hoje falar do meu incômodo com a velocidade do tempo e acabei falando de tantas coisas, tudo junto e misturado, certamente por conta da pressa que esta velocidade impõe. E por pressa, por ter outras coisas para escrever, apesar da hora, páro por aqui.T.

segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

O tempo de Lula e o tempo que virá

Compartilho com vocês o artigo publicado no Correio Braziliense do dia 01 de janeiro de 2011


Estou mergulhada na edição de A era Lula, série documental que a TV Brasil exibiu na última semana de 2010. Com uma valorosa equipe que sacrificou as folgas de fim de ano para finalizar o trabalho, revisito as imagens deste período extraordinário para o Brasil. Saio da ilha e venho ao computador escrever o artigo. Como desejar feliz ano-novo aos leitores oferecendo alguma reflexão não tediosa?
Falarei das expectativas em relação à presidente Dilma ou compromissos que, como todo mundo, eu também fiz comigo mesma para o ano que se inicia?

Prometo fazer dieta, não faltar à academia, reduzir a carga de trabalho e o estresse, ficar mais em casa e com a família, viajar mais com meu filho. Ir mais ao cinema e cuidar mais de meu jardim. Contemplar mais vezes o entardecer sobre o lago, o sol morrendo atrás da Ponte do Bragueto enquanto as garças voejam e um casal de quero-quero faz rasantes sobre o gramado. Eu prometo, mas sei que não resisto aos chamados da vida embora esteja decidida a reduzir a velocidade.

Venho para o computador, mas as imagens que deixei na ilha não se despregam de mim. E elas me dizem que preciso falar, ainda um pouco mais, destes anos felizes e sofridos, estimulantes e decepcionantes, extraordinários e banais, esses anos irrepetíveis, depois dos quais nada mais será como antes no Brasil. Já falei do legado de Lula no artigo de dezembro, já dirigi uma série de TV falando disso.
Agora estou me referindo a um tempo, não exatamente a um governo. Um tempo em que Lula esteve no centro da nossa vida e isso vale para os que o admiraram como para os que o odiaram, para os que o apoiaram como para os que desejaram seu fracasso e mesmo sua derrubada. Um tempo é mais que um governo embora todo governo faça parte de um tempo.

O tempo em que vivemos sob Lula foi especial pelas razões já tão apontadas: porque alguém nascido do povo finalmente governava para o povo e fazia isso de modo absolutamente natural, com uma autenticidade irritante para os cultores do poder representado; porque, sem tisnar interesses, seu governo moveu o equivalente a uma França, fazendo com que 50 milhões de brasileiros ascendessem na escala social, para desgosto dos que desconhecem completamente o sentido da pobreza; porque, apesar da ampla aprovação popular, foi quase regra, nos meios de comunicação, retratar Lula como bravateiro tosco, senão como farsante; porque, apesar destas crônicas domésticas, lá fora existiu outro Lula, não apenas líder do Brasil e de nossa região, mas portador de nova mensagem na política internacional, que resultou em novos consensos e novos instrumentos de decisão multilateral, como o G-20 e a Unasul.

Um Lula que recebeu prêmios prestigiosos. O jornal francês Le Monde o escolheu como Homem do Ano em 2009. Logo depois o diário espanhol El País deu-lhe o título de Personagem Ibero-Americano e o Financial Times o incluiu entre as 50 personalidades que moldaram a década. O Forum Econômico de Davos deu-lhe o título de Estadista Global. Nem tudo foi resolvido em seu governo nem faltaram momentos de decepção. Faltou uma reforma política, avançamos pouco na saúde e na educação, não enfrentamos alguma questões delicadas, entre elas, a impunidade dos torturadores. Mas os tempos que vivemos sob Lula ficaram também marcados por grandes mesquinharias que devemos nos  esforçar para superar, agora que ele saiu da Presidência para voltar às ruas, como disse. Sob Lula, conhecemos o ódio de classe e, de certa forma, aos pobres. Chamaram o Bolsa-Família de bolsa-esmola.

Os que nunca acenderam uma lamparina desdenharam o programa Luz para Todos. O preconceito contra os nordestinos aflorou, sobretudo após a vitória de Dilma. Sob Lula, o jornalismo abandonou seus melhores cânones, colocou de lado as regras da boa técnica que fizeram da imprensa brasileira, sobretudo nos tempos da transição da ditadura para a democracia, uma das melhores do mundo. Sob Lula, a conjunção adversativa “mas” passou a frequentar as manchetes de jornais quando a notícia era positiva.

Agora vamos ser governados por uma mulher e, no que pese a novidade de gênero e o apoio de Lula, ela é branca, bem-nascida e tem curso superior, o que pode lhe render alguma boa vontade, pelo menos no início. Devemos aproveitar a lua de mel para deixar para trás, definitivamente, as torpezas e mesquinharias cometidas contra Lula e sob Lula, em grande parte porque lhe faltava um berço, um sobrenome, um diploma de curso superior e aquelas boas maneiras que só a elite conhece. A oposição pode ser mais eficiente sendo menos raivosa. A imprensa pode ser crítica sem ser preconceituosa. Seremos mais felizes com menos idiossincrasias. Tenhamos todos um feliz 2011.

sábado, 1 de janeiro de 2011

Era uma vez no Brasil

Cheguei do Itamaraty há pouco: o coquetel de posse da presidenta Dilma era, naturalmente, uma colmeia agitada: muitos encontros, reencontros, apresentações, combinações, articulações. A grande maioria dos 4 mil convidados nao conseguiu cumprimentá-la. Mal conseguiu vê-la de longe.  Todos sabem que é assim mas todos querem estar lá.  O momento é unico: uma mulher chega à presidência e quebra mais um tabu da nossa historia política. Ave Dilma, feliz Governo!

Frequento aquele  palácio há um quarto de  século e dele tenho belas lembranças que um dia contarei. Mas sempre que estou lá, no salao de recepções, faço minha homanagem silenciosa a Niemeyer e a Lucio Costa, que nos deram tão elegante e tão brasileiro espaço para estas festas.

Em casa, agora, leio pela Internet que Lula chegou a São Bernardo, acompanhado do senador Sarney. O presidente do Senado tornou-se um grande amigo de Lula e teve um gesto de elegancia e delicadeza. Ele sabe o que é deixar a Presidencia.  Eu estava ao pe da rampa quando ele a desceu em 1990, após transmitir o Governo a Collor.  Era o primeiro presidente civil entregando a faixa ao primeiro presidente eleito, depois da ditadura. Vastas emoções ao pé da rampa, e algum pressentimento.

Leio que Lula chorou o voo todo. Dirão que por apego ao poder, dirão que isso apenas prova que nao queria deixar a presidencia.   Para entender este choro é preciso não apenas conhecer a vida de Lula. É preciso pertencer ao mundo de Lula: o mundo dos que vieram de muito longe, de muito baixo, sem berço e sem tradição, sem posses, sem referencias, contando apenas com uma mãe e um sentimento de luta.

Lula deixou o Planalto com 83% de aprovação. Não caiu na tentação do terceiro mandato,. nao mudou a Constituiçao em favor proprio. Se ele nao tivesse feito mais nada na presidência, já lhe deveriamos esta prova irrefutável de que é um democrata e um republicano. Se nao tivesse feito mais nada pelo Brasil. já lhe deveriamos ser reconhecidos por isso.

Agora vai começar o Brasil sem Lula na presidencia. Falemos dele depois.

T.