segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Antes de virar a pagina


Correio Braziliense | Opinião – 06/11

Antes de virar a página :: Tereza Cruvinel
Jornalista

Encerrei em 31 de outubro o mandato com que me honrou o ex-presidente Lula, para implantar a Empresa Brasil de Comunicação e presidi-la no primeiro quadriênio. Tenho orgulho de ter contribuído para dotar nossa democracia de uma instituição que lhe faltava, o sistema público de radiodifusão. Saí com as mãos limpas e a alma maior. Agradeço ao Correio Braziliense pelo espaço de manifestação que me proporcionou neste período.

O custo foi alto, mas valeu a pena. Dirigentes, funcionários e apoiadores deixamos um legado importante, que a nova gestão, sob a liderança de Nelson Breve, irá fortalecer e ampliar. Ele não se restringe à TV Pública, hoje realidade nacional e internacional. Pode ser conferido no vídeo e na publicação Quatro anos de um ideal democrático, em www.ebc.com.br.

 Por esse legado, enfrentamos grandes adversidades e uma incompreensão brutal e macarthista. A renúncia teria me poupado, mas teria comprometido o projeto. Pensei nela quando ficou difícil comandar diretores que eu não escolhera. O ex-deputado Virgílio Guimarães me advertiu: “A MP não passará e você será a culpada”. Mais tarde, em outra crise, o conselho sensato foi do senador Tião Viana: “Votamos a lei confiando em você. Está nos anais. Renunciando, você ofende o Congresso”. Em 2009, consegui voar de Belém para Brasília no avião presidencial, pela única vez, para dizer a Lula que iria sair. “Não faça isso, você começou a obra, precisa terminar. Tire todo mundo que estiver atrapalhando”, disse ele. Prossegui. Na última semana de seu governo, ele insistiu, como já fizera o ministro Franklin Martins, cujo apoio nunca me faltou, na importância de cumprir o mandato até o fim, fazendo valer a lei.
Deve ter sido um erro, mas fiquei para concluir o mandato. Nunca desejei nem pleiteei mais quatro anos. Agora havia também o conflito com o Conselho Curador. Uma nova maioria substituira os conselheiros nomeados por Lula, formada por nomes oriundos de consulta pública e selecionados pelo Conselho. Para ela, o Conselho tem poder sobre tudo na EBC, e não a tarefa de zelar pelos princípios na programação, como diz a lei. Reagi à ideia de uma diretoria subalterna, traduzida pela grosseria pública do conselheiro Aarão Reis: “Sua função é trabalhar, a minha é te controlar”. Tudo culminou com a ordem para tirar do ar os programas religiosos, em nome do Estado laico. O Conselho não é gestor da grade. Os programas constavam da grade anual. Expus a divergência em artigo nesta página. A TV Pública deve espelhar a sociedade, plural e diversa, não o Estado. Por fim, a Justiça concedeu liminares às igrejas e o Senado condenou a resolução, prometendo revogá-la por decreto legislativo. A diretoria refletira corretamente a sociedade.

Outros conflitos houvera. Tivemos que refazer o Plano de Trabalho 2011, nele incluindo informações orçamentárias, tema afeto ao Conselho de Administração. O modelo tecnológico do Operador de Rede foi questionado, os investimentos em rádio também. Em 25 de agosto, reiterei à presidente Dilma que, mesmo se quisesse, continuar seria submeter-me a uma destituição já anunciada por notas na imprensa. É só buscar no Google. Elas diziam que, se Dilma me reconduzisse, o Conselho aprovaria meu impeachment, ou seja, a destituição pelo voto de desconfiança, prevista na lei. O blog Poder Online em 9/9/2011 avisou: “O Conselho não nomeia mas demite”. Na véspera, eu participara de reunião com a presidente e os ministros da Secom e do Minicom. O tema era tevê digital.

Pensaram que era recondução.

Acelerei a transição com Nelson, que eu levara para a EBC e era o nome consensuado. Fizemos o balanço da gestão, mas o Conselho cancelou a audiência pública em que seria apresentado. Em ato no dia 27, fizemos o balanço e a despedida. A ele compareceram mais de 300 pessoas, os presidentes do Senado e da Câmara, parlamentares, diplomatas, jornalistas, produtores audiovisuais. Os resultados foram mostrados e aplaudidos. Mas fontes ocultas informaram, por alguns jornais, que perdi a disputa pela recondução. Que o governo me trocou por discordar da gestão. Correta, só a informação de que o Conselho não me queria. Mas não informava por quê. Há um dano moral nisso. Precisei revelar, em coletiva, o não apurado. Ao virar a página, espero que a diretoria agora possa trabalhar e que o Conselho retorne ao seu relevante papel institucional e legal.

Um comentário:

  1. A TV Brasil é de longe a melhor opção na TV aberta (e muitas vezes na paga também).
    Abrir janelas para a diversidade, diferentes opiniões, o cinema latinoamericano, os curtas... são muitos pontos positivos.

    Falta melhorar o sinal e o som.

    Parabéns, Tereza. Boa sorte!

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